O pandemônio na literatura brasileira: entre miojos e metamorfoses
Um desabafo sobre a pressa, a superficialidade e a urgência de escrever com intenção.
Olá, como você tem passado?
Achei esse texto antigo (2016). E quando eu digo que usar a si mesma como régua de qualidade e melhoria é essencial, é disso que estou falando. Ao reler esse desabafo de alguns anos atrás, percebi — além dos erros técnicos — o quanto havia raiva, urgência e imaturidade em mim naquele momento. Hoje, um pouco menos imatura, mas muito mais consciente do meu caminho, sigo um dia por vez dentro desta metamorfose que sou. E compartilho contigo uma nova versão desse texto, com a mesma essência, mas com as bordas mais bem costuradas.
— Uiara Mei
Vamos ser francos: a literatura brasileira contemporânea está num pandemônio. Uma correria frenética por likes, lançamentos e autopublicações — onde muitas vezes se escreve mais para agradar o algoritmo do que para mover a alma de alguém.
Não estou aqui como a “fodona” da escrita. Estou no campo de batalha, estudando, errando e recomeçando. Mas, como alguém que decidiu gastar as solas dos sapatos nesse caminho, me sinto no direito (e no dever) de levantar algumas questões.
Nas bienais de hoje, se Aristóteles ressuscitasse e aparecesse por lá, talvez se jogasse direto na Baía de Guanabara. Para ele, a literatura precisava ter função existencial: provocar uma catarse, gerar valor moral e subjetivo. Uma obra literária, para além da estética, precisava mover. E cá entre nós: muitas das obras que hoje ocupam prateleiras e feeds não provocam nem coceira. São miojos literários. Três minutos, sem sustância, e fim.
Mas todo mundo pode escrever, né?
Claro que sim. Eu mesma comecei assim: sonhando. Mas chega uma hora em que o sonho precisa encontrar a disciplina. E aí surgem as perguntas incômodas:
Escreve por quê?
Escreve pra quem?
O que quer com isso?
Onde está a pesquisa, o estudo, o planejamento?
Muitos dizem que apenas “sonham e escrevem”. Mas será que só isso basta? O que acontece quando se transforma a escrita — uma ferramenta de potência humana — em mero entretenimento descompromissado, vazio de propósito?
Likes, fama e o culto ao instantâneo
Hoje, o que mais conta parece ser o número de seguidores. A obra virou produto. E, nesse mar de rostos e mãos digitando freneticamente, me pergunto: o que vale mais? O impacto real ou a visibilidade momentânea?
Quando entro em alguns grupos de escritores, me sinto isolada. Há algo na pressa, na superficialidade, que me entristece. E se um crítico literário sério parasse para ler boa parte dessas obras que “bombam” por aí... seria um massacre.
Não porque esses autores não tenham valor — muitos têm. Mas porque não foram incentivados a estudar. Foram levados a acreditar que escrever é só despejar emoção e publicar. A escrita virou palco, não processo.
A diferença entre resenha e crítica
Outro ponto que me incomodava (e ainda incomoda) é essa confusão entre resenhista e crítico literário. Resenhista apresenta, vende, faz girar o mercado. Crítico literário analisa, aprofunda, qualifica a obra. São funções diferentes — e ambas importantes. Mas não dá pra fingir que são a mesma coisa.
O que eu penso, hoje
Hoje, com mais maturidade e menos raiva, ainda defendo o mesmo princípio: não escrevo só para distrair. Quero tocar, provocar, tirar do senso comum. Quero escrever com intenção.
Não acredito que tudo seja arte só porque foi publicado. A arte exige esforço, consciência e uma certa entrega. E, sim, gosto é gosto — mas isso não deve nos impedir de manter critérios. Há livros excelentes que seguem esquecidos porque muitos leitores preferem o que é mais fácil, mais popular, mais superficial.
E isso, é claro, não é culpa só dos leitores. É reflexo de um sistema educacional sucateado, de um país que pouco valoriza a leitura crítica. O resultado? Tá chovendo livro... mas o analfabetismo funcional tá galopando.
Escrever “direitinho” não é elitismo. É resistência.
Quando digo que quero escrever bem, com cuidado e profundidade, não é pra ser lida por burgueses. É porque acredito que escrever bem forma leitores melhores, e leitores melhores mudam o mundo.
A nossa literatura deveria, no mínimo, ter intenção de transmitir algo significativo. Não dá pra imitar o modelo hollywoodiano achando que isso é literatura brasileira. A gente tem raízes, tem voz, tem dor e tem beleza. Tudo isso precisa aparecer — mas com estudo, com construção.
E, por fim...
Não quero generalizar. Não quero apontar dedos e dizer que ninguém presta. O que quero é que paremos para pensar. Que a gente se pergunte o que estamos construindo com essa avalanche de publicações, plataformas, selos e editoras caça-níquel.
Escrever ainda pode ser um ato profundo. Ainda pode ser arte. Ainda pode ser revolução.
“Transformar uma folha em branco em um documento, uma identidade de um tempo.
Fragmentos gravados na alma, no universo.
Esse é o prazer do poeta, do escritor:
deixar um pouco de si para aquele que quer se compor.”
— Uiara Mei
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